Little Joey
Joe, vedeta da rádio, anuncia o prémio da noite: «Boa noite, meus
queridos-queridas! Gozem-na bem! E que Deus vos guarde da bófia!» É esta a
ignição de uma máquina policial alimentada pelo medo e geradora de violência,
numa linha de produção que teremos oportunidade de observar em cenas sucessivas
como numa espécie de rodízio ou à laia de peep show. Num cenário suburbano,
abusos sexuais, violações, vandalismo, furtos, assassínios, vão sendo enquadrados
pelo animador de pista que, a dado momento, sugere ao público: «olhai para o
que se move no abismo e cujas sombras começais a adivinhar.» O espectáculo
ainda agora começou.
“Police Machine”, de Joseph Danan, estreou no México, em 2009, e chega a Portugal em encenação do próprio autor. De uma das sociedades mais violentas do mundo para a nossa, a do povo sereno, o que se mantém inalterável? Talvez a noção de que não estamos isentos da barbárie, tal como casos recentes indicam, tenham eles ocorrido nas salas de interrogatório do SEF, nas imediações de uma escola, nas zonas esconsas de uma cidade (lembram-se de Gisberta?), em estádios de futebol, seminários ou à porta de discotecas. Parte integrante do nosso dia-a-dia colectivo, deverá a violência ser varrida para debaixo do tapete? Nesta peça o confronto é, precisamente, com uma das dimensões da realidade que ou tendemos a disfarçar ou espectacularizamos em proveito mediático, como se não fosse possível reflecti-la.
Joseph Danan (1951), escritor e professor emérito no Instituto de Estudos Teatrais (Sorbonne Nouvelle – Paris 3), é autor de vários ensaios, alguns livros de poesia, pequenas ficções, romances e peças para teatro. Foi traduzido para português e levado à cena pelo Teatro da Rainha com as peças “Dodô – no rasto do pássaro do sono” (2010), “Jojo, o reincidente” (2011), “O Teatro dos Papás” (2013), “O homem que queria (não) ser sábio”, incluída no espectáculo “Pensa, logo sangra” (2016), e “As Aventuras de Auren, o pequeno serial killer” (2016). Fernando Mora Ramos, director do Teatro da Rainha, encenou ainda a peça “R. S/Z, Espectro de Improviso” (2012) com alunos da Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo. Conhecedor profundo de Brecht, Beckett, Koltès e de toda a dramaturgia contemporânea, dinamizou, em 2017, uma Oficina de Escrita Teatral no Teatro da Rainha. Algumas peças de Joseph Danan foram encenadas por Alain Bézu, Jacques Kraemer, Joël Jouanneau, Jacques Bonnaffé e muitos outros.
Sobre este espectáculo, declara Fernando Mora Ramos, director do Teatro da Rainha: «“Police Machine” é uma estranha engrenagem. Desde logo o título “Máquina Policial”, tradução que seria sempre coxa de um título que sem ela se percebe bem e é mais reluzente. Obviamente o nome remete para “Hamlet Machine”, de Heiner Müller. Talvez no que em “Hamlet Machine” se leia violência da história, história como sucessão de massacres de que resulta a Europa em ruínas, em “Police Machine” seja depararmo-nos com um presente que activa uma única linguagem, a violência é a comunicação dominante, uma violência que encadeia violências, daí a máquina.»
Em cena, um corpo heterogéneo de actrizes e de actores, composto por Beatriz Antunes, Mafalda Taveira, Marta Taveira, Fábio Costa, Fernando Mora Ramos e Nuno Machado, traveste-se em quadros de uma intensidade extrema. Há carrascos transformados em vítimas, porque nem todas as vítimas são inocentes nem todos os criminosos são automaticamente culpados. A violência anda pelas ruas e entra-nos em casa pelos mass media, seja sob a forma subjectiva dos actos individuais, seja sob um modo objectivo e sistémico menos perceptível. O que são movimentos tais como “Black Lives Matter”, “Me Too” ou o “Fridays for Future” (Juventude pelo Clima), senão modos de dar resposta a essa violência invisível?
“Police Machine”, de Joseph Danan, estreia dia 3 de Novembro e manter-se-á em cena, de quarta a sábado, até 26 do mesmo mês. Sempre às 21h30, na Sala Estúdio do Teatro da Rainha.
“Police Machine”, de Joseph Danan, estreou no México, em 2009, e chega a Portugal em encenação do próprio autor. De uma das sociedades mais violentas do mundo para a nossa, a do povo sereno, o que se mantém inalterável? Talvez a noção de que não estamos isentos da barbárie, tal como casos recentes indicam, tenham eles ocorrido nas salas de interrogatório do SEF, nas imediações de uma escola, nas zonas esconsas de uma cidade (lembram-se de Gisberta?), em estádios de futebol, seminários ou à porta de discotecas. Parte integrante do nosso dia-a-dia colectivo, deverá a violência ser varrida para debaixo do tapete? Nesta peça o confronto é, precisamente, com uma das dimensões da realidade que ou tendemos a disfarçar ou espectacularizamos em proveito mediático, como se não fosse possível reflecti-la.
Joseph Danan (1951), escritor e professor emérito no Instituto de Estudos Teatrais (Sorbonne Nouvelle – Paris 3), é autor de vários ensaios, alguns livros de poesia, pequenas ficções, romances e peças para teatro. Foi traduzido para português e levado à cena pelo Teatro da Rainha com as peças “Dodô – no rasto do pássaro do sono” (2010), “Jojo, o reincidente” (2011), “O Teatro dos Papás” (2013), “O homem que queria (não) ser sábio”, incluída no espectáculo “Pensa, logo sangra” (2016), e “As Aventuras de Auren, o pequeno serial killer” (2016). Fernando Mora Ramos, director do Teatro da Rainha, encenou ainda a peça “R. S/Z, Espectro de Improviso” (2012) com alunos da Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo. Conhecedor profundo de Brecht, Beckett, Koltès e de toda a dramaturgia contemporânea, dinamizou, em 2017, uma Oficina de Escrita Teatral no Teatro da Rainha. Algumas peças de Joseph Danan foram encenadas por Alain Bézu, Jacques Kraemer, Joël Jouanneau, Jacques Bonnaffé e muitos outros.
Sobre este espectáculo, declara Fernando Mora Ramos, director do Teatro da Rainha: «“Police Machine” é uma estranha engrenagem. Desde logo o título “Máquina Policial”, tradução que seria sempre coxa de um título que sem ela se percebe bem e é mais reluzente. Obviamente o nome remete para “Hamlet Machine”, de Heiner Müller. Talvez no que em “Hamlet Machine” se leia violência da história, história como sucessão de massacres de que resulta a Europa em ruínas, em “Police Machine” seja depararmo-nos com um presente que activa uma única linguagem, a violência é a comunicação dominante, uma violência que encadeia violências, daí a máquina.»
Em cena, um corpo heterogéneo de actrizes e de actores, composto por Beatriz Antunes, Mafalda Taveira, Marta Taveira, Fábio Costa, Fernando Mora Ramos e Nuno Machado, traveste-se em quadros de uma intensidade extrema. Há carrascos transformados em vítimas, porque nem todas as vítimas são inocentes nem todos os criminosos são automaticamente culpados. A violência anda pelas ruas e entra-nos em casa pelos mass media, seja sob a forma subjectiva dos actos individuais, seja sob um modo objectivo e sistémico menos perceptível. O que são movimentos tais como “Black Lives Matter”, “Me Too” ou o “Fridays for Future” (Juventude pelo Clima), senão modos de dar resposta a essa violência invisível?
“Police Machine”, de Joseph Danan, estreia dia 3 de Novembro e manter-se-á em cena, de quarta a sábado, até 26 do mesmo mês. Sempre às 21h30, na Sala Estúdio do Teatro da Rainha.
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