sexta-feira, 10 de junho de 2011

EM PANTANILLO




A don Federico Valle


1


Mil passos arrastam pacientemente as solas maduras em rochas diferentes.
Talvez uma gota gema desejando a antiga espessura em tardes mais livres que esta (gaguejante de impuro colorido, de sol inibido, de água acobreada, de cavalos com caldas etéreas, do pranto do cacto impotente…). A cascata reverdeja os pastos silenciosos que nutrem a negra penugem da terra vestida de brilho.
Sombras persistentes, imagens constantes que obrigam as retinas a carregá-las alegremente em frágeis blocos. Montanhas vibrantes de cercania solar, de chuva inaudita, de flores invisíveis possíveis de criar debaixo de tanto céu, tanto lume cromático, tanta conjectura de lugar
.


2


Os meus dedos dactilografam do mesmo modo… (talvez contribuam com seus ruídos para aumentar os ruídos naturais de fundo).
As vozes elevam-se pretendendo matizar as aspirações de solidão a que os espaços obrigam. Cânticos pujantes de fragrância primaveril caem de surpresa no nevoeiro. Os lábios adensam as notas. Lábios fechados por rugas habilmente conseguidas. Lábios dobrados sobre dentes felizes. Lábios que riem debaixo da opressão tensa do manto ungido de vários tons (eu vermelho, tu azul, ele verde, ela cinzento…). Começa a lide cromática. Cada cor requer um espaço maior na tela. Claro que nenhuma quer sucumbir. Claro que nenhuma deseja dissolver-se anonimamente. E assim continua, assim caminha, assim se vê esfumar as folhitas a preto e branco deste calendário que transpira o suor de um calor intangível
.


3


As montanhas permanecem impávidas. Dúvida tremenda: arranhar-se debaixo do manto carnal ou remover os caules difusos tentando encontrar o perfil da flor única à luz de um enlevo descolorido.

Alejandra Pizarnik, in La Tierra Más Ajena (1955)

Versão de HMBF

1 comentário:

Simone Teodoro disse...

Gostei muito do blog! tenho traduzido Pizarnik e cheguei aqui por causa dela!