sábado, 27 de abril de 2013

O SUICIDA




E isto, senhoras e senhores, que de facto eu não estou
a dirigir, foi durante os últimos minutos o escritório
desse homem desconhecido. Ali temos as contas
na bandeja, a cinza no cinzeiro, memorandos cinzentos
empilhados junto ao cinzeiro, caixas de arquivo em fila, o júri
parcial da sua correspondência sem resposta
balançando sob o pisa-papéis  à passagem da briza
que vem da janela por onde ele partiu; e aqui está o receptor
avariado que nunca foi concertado e o bloco de apontamentos
com o seu último esquiço, que tanto pode ser uma úlcera
no seu aparelho digestivo como o labirinto florido
onde se terá perdido deliciosamente até ter tropeçado
súbita e finalmente consciente de tudo quanto lhe faltou
num poço coberto de malvas. A ponta do lápis
obviamente se quebrou; porém, quando abandonou esta sala
por artes mágicas ou simples evaporação,
àqueles que o conheceram pela confusão gerada na rua
este homem de sorriso tímido deixou para trás
qualquer coisa que ficou intacta.


Louis MacNeice (1907-1963)


Versão de HMBF.

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