terça-feira, 26 de novembro de 2013

DA LUZ


Nunca recebi tantos parabéns no meu dia de anos como este ano. Culpa minha, esqueci-me de desactivar o Facebook nesse dia (foi o que fiz noutros anos). Reparo agora que na página do saudoso Torquato da Luz são igualmente muitos os parabéns, votos de felicidades e até de dias bons. Portanto, vivo ou morto o ente facebookiano é merecedor da mesma atenção. Esbatem-se fronteiras definidoras de conceitos, o mundo metamorfoseia-se num vazio de conhecimento do outro que o reduz a mera identidade virtual. Desejam-se dias felizes aos mortos como se estivessem vivos, vida e morte passam a estar ao mesmo nível, tal como presença e ausência, proximidade e distância. Estamos ali no corpo de uma fotografia, de um perfil, músculos, nervos, órgãos vitais transformados em pixéis e códigos informáticos a partir dos quais mostramos que sentimos, que somos gente. Qualquer dia fazem-se filhos assim, mortos ou vivos. E deles trataremos como das galinhas no Farmville.

1 comentário:

Marina Tadeu disse...

Imortalidade de pixéis sem músculo, de facto, soa um bocadinho a logro mas a perspectiva do fb ter muitos mais mortos que vivos, tem as suas contrapartidas. Podemos falar com eles sem ter de ir à bruxa, por exemplo. Mandar mensagens muito importantes como um dia destes passamos por aí para emprestar o berbequim… Podemos alugar a necrófagos identidades de amigos e familiares de quem sabíamos os passes, celebrar o 150º aniversário de um avô, denunciar a foto desactualizade de um perfil, exigir que nos devolvam o vinil dos grandes êxitos dos Brotherhood of Man e até desvendar segredos, declarar amores e insultar a torto e a direito sem dar azo a retaliações desagradáveis.