sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

TRÍPTICOS DA NUDEZ #3

Com o recuo do Blogger em matéria de nus (explicado aqui), seria normal interromper esta série de trípticos. Afinal, outro motivo não havia para despentear a linha editorial senão o uso do contraditório. Mas agora tomei-lhe o gosto. Aguenta-te Maria.
 

O tríptico de hoje é, na realidade, um políptico. Regresso aos temas bíblicos através d’O Retábulo do Cordeiro Místico – ou A Adoração do Cordeiro -, magnum opus dos irmãos Van Eyck. Conta-se que «teve uma história acidentada: quase destruído em 1566 pelos calvinistas, foi desmembrado em 1816 (altura em que alguns painéis foram vendidos) e danificado por um incêndio em 1822». Graças a Deus, nem tudo se transformou em cinza. Muito do prestígio de Jan Van Eyck (1390-1441) deve-se a esta obra cujos painéis começaram a ser pintados pelo irmão mais velho Hubrecht, embora deste não se fale tanto. Dois nus sobressaem na fila superior. Do lado esquerdo, a figura de Adão. Do lado direito, Eva. Pintados com mestria realista, são de um humanismo sem precedentes na escola flamenga. Vistos de perto têm outra graça.
 

Repare-se como os olhos de Adão sobressaem num rosto onde as rugas, as olheiras, a profusão capilar invocam uma humanidade desesperada. A posição do pé direito, ligeiramente levantado, e do braço esquerdo, dobrado sobre os abdominais na direcção do braço direito, sugerem um movimento na direcção de Eva.
 

Na outra ponta da fila, Eva está parada e segura na mão o fruto do pecado. É um fruto estranho de superfície engelhada, a qual contrasta com as formas indúcteis dos seios, redondinhos e apetecíveis, e com o abdómen exageradamente curvo. Estaria grávida de Adão? Impossível evitar a heresia: olhamos para estes dois e sentimos que somos nós o fruto do pecado. Se por nós morreu Cristo na cruz, também por nós estes dois se amaram, correram riscos, desrespeitaram, agiram. A penugem do ventre não foi esquecida, ao contrário de outras representações onde pêlos, pilosidades e cotões são banidos da história como se a gilete tivesse sido descoberta antes do fogo. Onde se encontra o terceiro nu neste maravilhoso políptico é tarefa que deixo ao leitor. Imagine que está a procurar o Wally num qualquer álbum de Martin Handford. Mas não procure em demasia, caro leitor. Pode cansar a vista e em vez de um Wally encontrar o José Cid com toda a lanugem no sítio e um disco de ouro no lugar das tradicionais folhas.  
 
 

2 comentários:

maria disse...

Aguento, pois! dispensava era o Cid...mas cada Adão disfarça-se com a parra que mais lhe convém. Há delas que é melhor ficar como estão.

Continua, que eu gosto. :)

hmbf disse...

:-))) a para do Cid é d'Ouro :)))

ou será platina?