quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

O MELHOR ESCRITOR NACIONAL

É redundante asseverar que José Rodrigues dos Santos vende imensos livros, o que não garante que tenha muitos leitores. Em Portugal lê-se pouco e mal, publica-se muito e o chamado jornalismo cultural é de uma mediocridade gritante. Quase sempre ao serviço de interesses económicos poderosos, ou reduzindo-se às simpatias e amizades mais interesseiras, o meio é o que é e enquanto retrato para o país que temos não está mal. Não vos admireis, portanto, que o autor de __________ (preencha quem tiver lido) tenha sido eleito o melhor escritor nacional. Quem o elegeu é outra conversa. Quem foi dito e achado no assunto pouco importa. Cavaco também teve quatro maiorias absolutas, Pedro Chagas Freitas mantém-se nos tops para escândalo da intelligentsia, o Correio da Manhã é o jornal mais vendido, Salazar foi ditador até à morte e, não satisfeito com isso, o seu povo ainda lhe deu o pódio no concurso Os Grandes Portugueses. O nível cultural deste bom povo anda pelo mesmo grau do civismo que vai sendo demonstrado em matérias tão sensíveis como a sinistralidade nas estradas e a violência doméstica, pelo que não é de admirar a imbecilidade social reinante. O que por vezes admira é haver quem com isso se admire, como se tivéssemos elites muito sofisticadas e de cabeça limpa. O que foi feito nas escolas em matéria de espírito crítico e de sensibilidade artística? O que foi feito em matéria de exigência? Mas pode alguém esperar que a sociedade mude a ler as crónicas do António Guerreiro e do Vasco Pulido Valente? Enfim, tento convencer-me do menos mau. Cá para mim estas eleições e estas vertigens selectivas não servem para mais do que pretexto à exibição de uma cultura que alguns julgam ter, outros pretendem parecer que têm e outros ainda alardeiam na esperança de que alguém os ouça. 

10 comentários:

Anónimo disse...

concordo plenamente.

(sou anónimo porque não posso ser outra coisa)

Luis Eme disse...

Embora não considere o JRS como grande escritor (embora seja alto...), ele é de facto lido.

E digo isto pela estatística das viagens de cacilheiro. é o autor de uma grande parte dos livros lidos nesta curta viagem Tejo lá Tejo cá.

Mas quantidade nunca foi sinónimo de qualidade.

Em relação aos críticos, há sobretudo muito "amiguismo". Muita pouca vergonha e e proteccionismo aos mesmos de sempre, mesmo que escrevam uma "merda".

hmbf disse...

Podemos fazer o seguinte exercício: olhar para a lista dos 50 livros mais vendidos nos últimos 5 anos em Portugal (http://expresso.sapo.pt/cultura/Livros/os-50-livros-mais-vendidos-nos-ultimos-cinco-anos=f750972) ou para os mais vendidos de sempre (https://en.wikipedia.org/wiki/List_of_best-selling_books) e pensar, imaginar, quanto disto sobrará no futuro.

Cuca, a Pirata disse...

Nada de novo e infelizmente nem sequer é um exclusivo nacional. É sabido que em matéria de leitura, e muitas outras coisas, a maioria não costuma não ter razão. Ainda assim, não percamos a esperança. Há 30 anos seria certamente pior é resta-nos esperar que daqui a 30 anos seja melhor. Embora tenha para mim que daqui a 30 anos o máximo de atenção que as pessoas serão capazes de prestar é a um microconto. Não sei se o romance sobreviverá.

hmbf disse...

Ainda há esperança para o microconto!

Claudia Sousa Dias disse...

Henrique, gabo-te a coragem. És dos poucos que se atrevem a atacar Sua Santidade o Papa da critica literária portuguesa. Também não há que ter medo da exocumunhão. Logo...

hmbf disse...

Ei, eu não ataco ninguém senão a minha própria consciência. Estou protegido pelo pombo, ele há-de fazer chegar a mensagem.

Claudia Sousa Dias disse...

Onde se "ataque" no meu comentário deve ler-se "crítica". "Ataque" faz parte do meu acervo de hipérboles.

Anónimo disse...

À trinta anos era pior? à trinta anos era certamente melhor, havia escritores de verdade e editores apaixonados pela literatura. Hoje há comerciantes da edição e o negócio é que impera no meio literário. Veja-se a reportagem sobre a edição no JL: editores preocupados com o negócio...

hmbf disse...

Anónimo, há 30 anos as taxas de analfabetismo eram incomparavelmente superiores, havia menos leitores, menos editores, menos diversidade. O negócio impera como sempre imperou. Esses editores apaixonados que refere viveram sempre falidos. E os que deixaram de estar falidos renderam-se ao negócio. A minha filha de 12 anos já leu mais livros do que eu tinha lido até aos 18. Os hábitos de leitura são diferentes. Resta saber se vamos aproveitar o que melhorou ou se vamos desperdiçar a oportunidade com discursos, por exemplo, como o seu.