sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

NOÇÃO DE RIGOR

Para a SIC, rigor é: isto. Não me espanta tanto quanto anda espantado o Ferrão. Ferrou-se. O jornalismo da pós-verdade foi rigorosamente desmontado pelo Truques da Imprensa Portuguesa: aqui.

O "fact check" ao "fact check" que a SIC fez a João Ferreira

Ontem à noite, Bernardo Ferrão (sub-director da SIC e, nos tempos livres, líder da oposição), num espaço de comentário em que tinha a seu lado José Gomes Ferreira, referindo-se ao caso que envolve o Ministro das Finanças e a administração da Caixa, disse que “PCP e Bloco de Esquerda, noutras situações tão graves como esta, teriam pedido a cabeça [do ministro] e estavam na praça pública a exigir demissões e estão neste momento completamente caladinhos.”
A linguagem era totalmente imprópria para um jornalista, até para os padrões de um jornalista que toma o lugar de líder da oposição. Mas o problema não era só a linguagem. Como, uma hora depois, João Ferreira sublinhou, o PCP não pede demissões de ministros, nem agora, nem antes. Este critério do partido é inequívoco e do conhecimento de qualquer pessoa que acompanhe a política portuguesa há alguns anos. A acusação de Bernardo Ferrão não tinha fundamento e o eurodeputado desafiou a SIC a procurar imagens de arquivo em que uma demissão de um ministro tivesse sido pedida pelo seu partido.
Sentindo-se desafiada, a SIC lá fez o seu "fact check" e saiu com as imagens: “Não se resolve o problema à peça. Não se resolve o problema substituindo este ou aquele ministro.”, disse Jerónimo de Sousa. “Para lá de exigirmos a demissão do ministro da Educação nós temos vindo a exigir a demissão de todo o governo”, disse João Oliveira. “Os Senhores já encontraram razões para pedir a demissão de dois membros do governo (…) e se pensarmos melhor encontramos razões para demitir os outros membros de governo que ainda não foram citados esta tarde”, disse, por fim, António Filipe.
“Já o embatucámos!” - deve ter pensado Bernardo Ferrão, que terminou a peça a “sambar na cara” do PCP e por pouco não mandou “beijinho no ombro.” Mas há um problema. É que neste "fact check", tal como os outros, aparentemente tão isento e tão neutro, reside um truque gravíssimo.
As imagens de João Ferreira apresentadas nesta peça estão editadas. Às suas declarações foram extraídas partes fundamentais. João Ferreira referiu-se a “comunicados do PCP” e afirmou que “o PCP nunca fez pedidos de demissão à peça, sempre identificou o conjunto do governo e procurou que as responsabilidades fossem assacadas ao conjunto do governo e quanto sinalizou a importância de pôr fim a uma determinada política fez isso mesmo, nomeadamente com o governo anterior do PSD e do CDS, em que aquilo que sinalizou era a necessidade para o país de pôr fim àquela política e isso não se resolvia com demissões à peça deste ou daquele ministro.”
Ou seja, as declarações de João Ferreira, ontem à noite, são absolutamente coerentes (não podiam ser mais) com as imagens que o fact check da SIC recuperou. “O PCP não pede demissões de ministros à peça, pede demissões de Governos inteiros. O problema do PCP não são este ou aquele ministro, são as políticas.”
Hoje de manhã, publicámos uma reflexão sobre o perigo que “fact check” podem representar. Quando mal usados, podem tornar-se verdadeiras armadilhas contra a opinião pública. Aqui fica - nem de propósito - um exemplo categórico.



Em suma: sempre que sintonizar a SIC, lembre-se de quão rigoroso é o Ferrão... a fazer mau jornalismo. 

4 comentários:

xilre disse...

A mesma SIC, que há pouco abriu o noticiário da noite referindo a «catástrofe inesperada em Angola» (sic). Certamente para a distinguir das catástrofes esperadas...

hmbf disse...

Não se chama catastrófico a um patrocinador.

Ivo disse...

Não sei se era eu que estava anestesiado ou delirante, o que sei é que há umas semanas, 4/5 talvez, o notíciário da noite da Sic abriu com uma entrevista, do Rodrigo Guedes de Carvalho se bem me lembro, em estúdio, ao advogado do miúdo que terá sido espancado pelos srs filhos do embaixador Iraquiano. Até aqui nada de anormal. Se não fosse exatamente ao mesmo tempo, estar a dar uma entrevista em estúdio, em direto, ao mesmo senhor, pela Judite de Sousa, na Tvi. Tendo em conta que eram estudios diferentes...
Portanto vale tudo.

hmbf disse...

É o rigor do vale tudo.