Para a SIC, rigor é: isto. Não me espanta tanto quanto anda espantado o Ferrão. Ferrou-se. O jornalismo da pós-verdade foi rigorosamente desmontado pelo Truques da Imprensa Portuguesa: aqui.
O "fact check" ao "fact check" que a
SIC fez a João Ferreira
Ontem à noite, Bernardo Ferrão (sub-director da SIC e,
nos tempos livres, líder da oposição), num espaço de comentário em que tinha a
seu lado José Gomes Ferreira, referindo-se ao caso que envolve o Ministro das
Finanças e a administração da Caixa, disse que “PCP e Bloco de Esquerda,
noutras situações tão graves como esta, teriam pedido a cabeça [do ministro] e
estavam na praça pública a exigir demissões e estão neste momento completamente
caladinhos.”
A linguagem era totalmente imprópria para um jornalista,
até para os padrões de um jornalista que toma o lugar de líder da oposição. Mas
o problema não era só a linguagem. Como, uma hora depois, João Ferreira
sublinhou, o PCP não pede demissões de ministros, nem agora, nem antes. Este
critério do partido é inequívoco e do conhecimento de qualquer pessoa que
acompanhe a política portuguesa há alguns anos. A acusação de Bernardo Ferrão
não tinha fundamento e o eurodeputado desafiou a SIC a procurar imagens de
arquivo em que uma demissão de um ministro tivesse sido pedida pelo seu
partido.
Sentindo-se desafiada, a SIC lá fez o seu "fact
check" e saiu com as imagens: “Não se resolve o problema à peça. Não se
resolve o problema substituindo este ou aquele ministro.”, disse Jerónimo de
Sousa. “Para lá de exigirmos a demissão do ministro da Educação nós temos vindo
a exigir a demissão de todo o governo”, disse João Oliveira. “Os Senhores já
encontraram razões para pedir a demissão de dois membros do governo (…) e se
pensarmos melhor encontramos razões para demitir os outros membros de governo
que ainda não foram citados esta tarde”, disse, por fim, António Filipe.
“Já o embatucámos!” - deve ter pensado Bernardo Ferrão,
que terminou a peça a “sambar na cara” do PCP e por pouco não mandou “beijinho
no ombro.” Mas há um problema. É que neste "fact check", tal como os
outros, aparentemente tão isento e tão neutro, reside um truque gravíssimo.
As imagens de João Ferreira apresentadas nesta peça estão
editadas. Às suas declarações foram extraídas partes fundamentais. João Ferreira
referiu-se a “comunicados do PCP” e afirmou que “o PCP nunca fez pedidos de
demissão à peça, sempre identificou o conjunto do governo e procurou que as
responsabilidades fossem assacadas ao conjunto do governo e quanto sinalizou a
importância de pôr fim a uma determinada política fez isso mesmo, nomeadamente
com o governo anterior do PSD e do CDS, em que aquilo que sinalizou era a
necessidade para o país de pôr fim àquela política e isso não se resolvia com
demissões à peça deste ou daquele ministro.”
Ou seja, as declarações de João Ferreira, ontem à noite,
são absolutamente coerentes (não podiam ser mais) com as imagens que o fact
check da SIC recuperou. “O PCP não pede demissões de ministros à peça, pede
demissões de Governos inteiros. O problema do PCP não são este ou aquele
ministro, são as políticas.”
Hoje de manhã, publicámos uma reflexão sobre o perigo que
“fact check” podem representar. Quando mal usados, podem tornar-se verdadeiras
armadilhas contra a opinião pública. Aqui fica - nem de propósito - um exemplo
categórico.
4 comentários:
A mesma SIC, que há pouco abriu o noticiário da noite referindo a «catástrofe inesperada em Angola» (sic). Certamente para a distinguir das catástrofes esperadas...
Não se chama catastrófico a um patrocinador.
Não sei se era eu que estava anestesiado ou delirante, o que sei é que há umas semanas, 4/5 talvez, o notíciário da noite da Sic abriu com uma entrevista, do Rodrigo Guedes de Carvalho se bem me lembro, em estúdio, ao advogado do miúdo que terá sido espancado pelos srs filhos do embaixador Iraquiano. Até aqui nada de anormal. Se não fosse exatamente ao mesmo tempo, estar a dar uma entrevista em estúdio, em direto, ao mesmo senhor, pela Judite de Sousa, na Tvi. Tendo em conta que eram estudios diferentes...
Portanto vale tudo.
É o rigor do vale tudo.
Enviar um comentário