terça-feira, 9 de maio de 2017

O MUNDO DELAS


Um dos prazeres que tenho na vida é olhar o mundo através dos olhos das minhas filhas. Isso é possível, em certa medida, observando as fotografias que elas vão captando com a máquina cá de casa.
Dá para perceber, por exemplo, a preferência da Beatriz pelos pormenores. É também mais experimental do que a Matilde, denota uma forte tendência para planos inclinados, fragmentos de estruturas que rasgam a paisagem ou decompõem o todo do qual são parte integrante. Percebo-lhe um desrespeito pela forma que, curiosamente, tem pouco que ver com o perfeccionismo a que se propõe sempre que executa uma tarefa. Há uma encantadora autonomia no olhar da Beatriz.
A Matilde é mais meticulosa e apolínea, gosta de enquadrar os fenómenos como quem procura contar uma história. Tem um olhar narrativo. Busca amiúde espaços amplos, abertos, tentando vislumbrar-lhes equilíbrio e coerência. Por outro lado, os motivos que lhe reconheço são quase sempre românticos, líricos, poéticos, uma poética do deslumbramento que também me encanta pela candura com que constrói os mundos do mundo.
Tenho duas filhas muito diferentes uma da outra, mas tenho igualmente dentro de mim o que a ambas distingue. Apolíneo numas coisas, dionisíaco noutras, divido-me com a noção do desafio constante que é manter-me equilibrado.
A fotografia ao alto é da Beatriz. A de baixo é da Matilde. 


2 comentários:

Claudia Sousa Dias disse...

Que coisa mais linda! Se não te importas, Henrique, vou partilhar.

hmbf disse...

Claro que não me importo.