sábado, 10 de março de 2018

[Às vezes existe]


Às vezes existe
uma rima interna
outras a renúncia
de uma vida inteira

Rimar com desistir
não é difícil — basta
escrever ir ou não ficar
O problema é a falta

de capital: não se vai
a lado nenhum sem
algum tipo de crédito


manuel a. domingos (n. 1977), in Interrupção (2014). Natural de Manteigas, estreou-se na poesia com “Entre o Silêncio e o Fogo” (2002). Também escreveu teatro e uma narrativa autobiográfica intitulada “Vala Comum” (2013), com a qual inaugurou o projecto editorial próprio de nome Medula. A este propósito, talvez não seja despiciendo citar Henry David Thoreau: «O poeta é aquele que tem gordura suficiente, como o urso ou a marmota, para lamber os dedos durante todo o Inverno. Hiberna neste mundo, e alimenta-se da sua própria medula». A poesia de manuel a. domingos inscreve-se, porém, numa tradição minimalista que terá em poetas como o norte-americano Raymond Carver ou o português António Reis antecedentes possíveis. Tradutor de Charles Bukowski, domingos assimilou a linguagem clara e irónica, auto-derrisória, amiudadamente cínica, do americano de origem alemã. A tendência para o aforismo será outra componente a ter em conta. Não sendo contemplativa, é uma poesia quase narcisista que desarma o leitor com uma essencialidade tão atenta às coisas do quotidiano, comezinhas, como ao efeito por elas produzido no humano. Com uma linguagem depuradíssima, objectiva, directa, crucial, próxima, por vezes, do silêncio, os poemas de manuel a. domingos resultam de um esforço de concisão que desmistifica o poético e relativiza o sublime.

9 comentários:

Anónimo disse...

Caro,

enganou-se. O poema em cima não coincide com a descrição em baixo. Uma pessoa lê a prosa da crítica, vai ao poema e apanha uma grande desilusão. Não se faz.

hmbf disse...

Posso ter-me enganado, o que não seria excepção. Mas nem o texto "em baixo" é uma descrição do "poema em cima" nem, muito menos, se trata de "crítica". Portanto, o seu comentário é um logro sobre o meu engano. Lamento.

Anónimo disse...

O poema é uma treta.

hmbf disse...

Para si.

Anónimo disse...

Com certeza: para mim. A "nova poesia" tornou-se um acto de preguiça. E a poesia deste domingos é exemplo de que um poeta descansa a sua poética ao sétimo dia. Então, viva a futilidade. Mais: essa espécie de sinopse sobre a essência poética do autor ainda continua a enganar o leitor. A amizade tem cada uma...

hmbf disse...

O manuel estará no próximo dia 20 em Caldas da Rainha para falar sobre essas e outras matérias associadas. Convido-o a estar presente e a debater ideias. Por ora, em que é que a sinopse é enganosa?

Anónimo disse...

É preciso ser mesmo muito amigo para atender a uma coisa dessas, visto que associar o manuel a uma ideia é uma contradição em termos. Força aí!

hmbf disse...

Não respondeu à minha questão, pelo que fica a convicção de que anda por aqui a perder tempo. Sugiro-lhe que não o desperdice mais.

Anónimo disse...

Se não vê a discrepância que existe entre a aproximação que fez à escrita do manuel e o poema que a ilustra então duvido seriamente que valha de alguma coisa tentar explicar o que quer que seja.