terça-feira, 27 de novembro de 2018

UM POEMA DE JORGE CALVETTI



O JORNALISMO

Todos, estou seguro,
se comoveram em algum momento,
ao lerem ontem o jornal.
Em todo o lado, aqui, no outro mundo
ocorreram coisas importantes:
um princípio de acordo
entre a Índia e o Paquistão;
a greve dos mineiros em Malargüe,
aquele preso torturado
que não delatou ninguém.
O jornal, ontem,
media o pulso ao mundo
e agora vejo-o embrulhando fruta,
amarrotado, no chão,
constelado por pingos de tinta
onde estão pintando,
cobrindo o peito de um bêbado
a dormir num corredor.
Leva-o o vento por todas as esquinas
e lá vão as
imagens do mundo, os feitos,
rostos possíveis da entrevista Realidade.
E com elas, voando para nada,
nossos pobres, enregelados destinos.

Amigo de Jorge Luis Borges, optou por uma vida na província a domar e a vender cavalos. Jorge Calvetti publicou o primeiro livro em 1944, Fundación en el cielo. Dizem que a sua poesia testemunha o amor à terra e às gentes do mundo rural, o que se verifica igualmente nos contos que escreveu. Em 1955, fundou com Néstor Groppa, Mario Busignani, Héctor Tizón, Medardo Pantoja e Andrés Fidalgo a revista literária Tarja. À sua obra foram atribuídos vários e relevantes prémios, tendo sido eleito, no ano de 1984, membro da Academia Argentina de Letras. Já em 1999, foi designado membro correspondente da Real Academia Espanhola. Trabalhou com diversos jornais e revistas. Com uma linguagem sóbria, tende frequentemente para uma poesia reveladora dos lugares e dos costumes dos povos. Sensível, delicada, ascética, são algumas das características geralmente atribuídas à sua poesia. Tinha 86 anos quando morreu. O poema acima transcrito foi traduzido por HMBF a partir da versão coligida por Marta Ferrari, in Poesía Argentina - Antología esencial, vol. 7 da colecção La Estafeta del Viento, dirigida por Luis García Montero e Jesús García Sánchez, Visor Libros, 2010, p. 98.

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