sábado, 12 de janeiro de 2019

UM POEMA DE EDGAR BAYLEY


UM HOMEM TREPA PELAS PAREDES E SOBE AO CÉU

Suspenso por um cabo
o homem que escala as paredes
tem botas resistentes com pitons
Escala as paredes
porque se esqueceu das chaves de casa
e enquanto escala as paredes
até chegar ao piso treze
pára por instantes
nas varandas de cada piso
onde inspira o aroma dos gerânios
das madressilvas
das hortênsias
das sardinheiras
Há sol
galhardetes
vendedores ambulantes
e mais além está o rio
e mais além as pontes
por onde se vai aos pampas
Em baixo estão os meninos
que saem das escolas
e pelo céu passam aviões e pássaros
e chapéus de abas largas
que o vento roubou aos desprevenidos
O cabo foi atado à viga
que sobressai no telhado
Um homem atou-o à cintura
e sobe agarrado ao cabo
com as mãos enluvadas
Usa um colete floreado e um boné aos quadrados
Deve chegar ao piso treze
onde tem de regar uns cravos
pisar milho
escrever umas cartas
e preparar um guisado
Sobe lentamente
e em cada piso pára um pouco para descansar
Entra na varanda de cada piso
e senta-se num cadeirão
ou estende-se numa espreguiçadeira
e conversa com a vizinha ou os vizinhos
e aceita um café ou um chimarrão
ou deixa cair um jorro de um odre de vinho
na sua garganta
ou joga às cartas
ou escuta confidências e dá conselhos
e conta algum episódio da sua vida
até que se despede com uma saudação
e continua a trepar pelas paredes
suspenso por um cabo
É o homem tem botas resistentes com pitons
o homem que escala paredes
e um colete floreado e um boné aos quadrados
que se esqueceu das chaves de casa
e inspira o aroma dos gerânios
e deve chegar ao piso treze
antes que apareçam as corujas
e se iluminem as janelas
Os pássaros e o rio estão longe
e a relva do parque
e os cavalos que galopam pela planície
e esta cadeira decomposta
e a banheira
sem uso
cheia de terra e de flores
e o mar e o navio que se aproxima
e a lagartixa que desaparece entre as rochas
e o vendedor de diários que lá de baixo
grita conselhos e advertências
enquanto o homem voa
ascende
conquista com esforço cada piso
e olha sempre para cima
a terra está longe
o céu está longe
O homem que trepa pelas paredes
suspenso num cabo
quando entra numa casa pela varanda
é bem recebido pelos vizinhos
e trata de lhes ser útil
mas num dos pisos
uma mulher inesperada
que é apenas uma
e ao mesmo tempo
todas as mulheres da sua vida
pede-lhe que a leve com ele
Então também ela se ata ao cabo
e sobe com o homem
para lá do piso treze
até às nuvens
ao ar livre
ao céu
ao vento
entre os gerânios
as sombrinhas as espreguiçadeiras
sobre pontes e quiosques
e mastros
e videiras
e algumas gotas
e sementes
e sonhos
com seu boné aos quadrados
com seu colete floreado
com o seu amor de sempre


Edgar Bayley, in Antología - La poesía del siglo XX en Argentina, Edición de Marta Ferrari, La Estafeta del Viento, Colección Visor de Poesía, dirigida por Luis García Montero y Jesús García Sánchez, 2010, pp. 127-130. Versão de HMBF. 

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