Bolas, este centro fica cheio, quando chove. Estou farto de estar na rua, sabes? A minha patroa e eu fomos para as arquibancadas... é simpático — muito sossegado e montes de espaço. Depois, começou a chover e ela pôs-se a chorar. Eu só lhe perguntava: O que se passa, 'mor? O que se passa? Sabes o que é que ela acabou por me dizer? «As beatas estão a ficar todas molhadas.» Merda, então bati-lhe. Ela ficou louca, os bófias levaram-na para a cadeia e a mim para aqui. Eu aguento uma ressaca. O problema é que, quando fico sóbrio, começo a pensar. Os alcoólicos pensam mais do que a maior parte das pessoas, essa é que é a verdade. Eu bebo só para calar as palavras. Merda, e se eu era mesmo baterista? Na última vez que aqui estive, havia uma Psychology Today que falava sobre bêbados sem-abrigo. Provava que os bêbados pensavam mais. Dizia que tinham melhores pontuações nos testes do que as pessoas normais e eram melhores em retenção. Havia só uma coisa em que tinham uma má pontuação, não valiam mesmo nada, mas não me lembro do que era.
Lucia Berlin, in Anoitecer no paraíso, — Mais histórias, trad. Ester Cortegano, Alfaguara, Novembro de 2018, p. 233.
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