John Freeman (n. 1974) foi editor da Granta entre 2009 e
2013, revista literária cuja edição portuguesa é publicada pela mesma editora
que acolheu por cá o seu primeiro livro de poemas. Mapas (Tinta-da-China, Março
de 2019), com tradução de Miguel Cardoso, surge à margem da colecção de poesia
da mesma editora, o que lhe confere certo destaque, mas quem esteja
familiarizado com a moderna poesia norte-americana perceberá não haver nada de
excepcional neste livro. Os três conjuntos nele incluídos mapeiam os lugares e
as memórias do autor, resvalando amiúde para um biografismo, de que o poema “A
Insciência” é o exemplo mais vivo, assinalado por perdas pessoais, pelo
contexto familiar, pela doença e pela dor. Este território íntimo faz-se
acompanhar por um percurso que nos desloca amiúde para cenários desoladores e
conflituosos, através de referências a Beirute, Sarajevo, Damasco, só para dar
três exemplos. Alguns poemas referem-se a situações específicas, localizadas no
espaço e devidamente datadas, outros são mera expressão de um intimismo marcado
pela dor da perda: «E / se tatuasse / a cara dela / na minha cara, achas / que
chega? Conduzimos / por uma milha, em / silêncio até nos / apercebermos de /
que é precisamente / isso que uma cara é» (p. 83). Fazendo uso de uma linguagem
sóbria e contida, Freeman relata-nos viagens no espaço e no tempo, faz de cada
poema testemunho de um momento onde a paisagem física se mistura com reflexão. Por
vezes o verso alonga-se e chega a transformar-se em prosa, sem que cheguemos a
dar pela diferença entre a realidade restringida no poema curto e a espraiada em
verso longo. Lá pelo meio há um poema em toada portuguesa:
SAUDADE
quer dizer nostalgia, fiquei a saber, mas também
nostalgia do que nunca foi. Mas não é
a mesma coisa? Num café
do Rio moscas coroam o meu copo.
Como te terias deliciado com isto: o empregado
a escurecer de suor a camisa de rede. Crianças
a trotar de fatinho ou calção comprido arrastando
brinquedos e toalhas rumo à praia. Falamos,
ou falo eu, imagino a tua resposta, o calor a toldar-nos
a vista.
Aqui, outra vez, o desgosto vertido na sua mais cruel
tradução:
o meu tu imaginado é tudo o que me resta de ti.
John
Freeman, in Mapas, Tinta-da-China, trad. Miguel Cardoso, Março de 2019, p.
103.
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