O trompetista Lee Morgan tinha 33 anos
quando foi alvejado pela mulher durante uma actuação no Slug’s Saloon. A neve
que então cobria Nova Iorque retardou a chegada dos primeiros socorros. Isto
foi em 1972. Esvaído em sangue, é provável que já não tenha escutado as sirenes
da ambulância. Tivesse esta chegado mais cedo e Lee talvez sobrevivesse aos
ciúmes de Helen. Começou a tocar cedo, com apenas 18 anos brilhava ao lado de
Dizzy Gillespie. Gravou muito, com os Jazz Messengers, com Cliff Jordan, com os
seus próprios quartetos, quintetos, sextetos. Há relações que nascem como
minúsculas manchas à superfície da pele, aí se desenvolvendo ao longo dos anos,
crescendo, alargando-se e disseminando-se pelo corpo. Às tantas, a mancha deixa
de estar apenas à superfície da pele e alapa-se na carne, toma-nos conta da
carne e dos músculos e dos ossos até nos sentirmos incapazes de qualquer
movimento. Só um tiro poderá salvar-nos da paraplegia, só um tiro poderá
desatar-nos a medula entretanto retorcida devolvendo-nos liberdade e paixão. Talvez
os ciúmes de Helen tenham sido libertadores, talvez o desaparecimento precoce
de Lee tenha sido o último dos improvisos na sua vida. Antes morrer de paixão
que ir morrendo desapaixonadamente.
2 comentários:
Tilha um disco do Gill /fuller e Dizzy Gillespie que AMAVA! Sumiu da minha casa. Não sei como ainda me lembro do nome. Tenho 75 anos e isso foi há mais de 50 anos...
Sumiços desses são frequentes cá por casa. Saúde.
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