Dia de apresentação (termo que prefiro a lançamento, por me enviar este para o desporto de romper céus com dardos, discos, martelos e bolas). Lançam-se foguetes, apresentam-se livros, apanham-se gripes. Chegam os convidados, familiares, amigos, eventualmente edilidades e padre da freguesia (tradição muito portuguesa), mais aquele solitário desconhecido que confere sentido ao absurdo. Ao centro, o ou a cicerone faz as honras da casa, guiando o auditório nos previsíveis momentos da função. Alguém apresenta a obra, tecendo loas ao autor e elogiando o volume sem o qual este mundo não seria o mesmo. Só não esclarece se seria melhor ou pior, mas todos tomam a hipérbole como elogio. Com sorte, o palrador terá graça e ensaiará uma ou duas piadas que livre os convivas do fastio plasmado nos bocejos. Segue-se o autor, muito tímido e sentido e emocionado e eternamente grato pela extraordinária apresentação que nada lhe deixou para acrescentar. E um momento musical oferecido por alunos do Conservatório local? Pode ser. Forma-se a bicha dos autógrafos e está feito. Sonho com isto tudo do avesso, uma apresentação "desapresentada", sem anfitrião nem um único convidado na plateia. Só o desconhecido, isolado, mudo, atento, obrigando o ensaísta de serviço a elucubrar para uma única alma penada mais as moscas aventuradas no vazio. E o apresentador diz mal, muito mal, do livro em análise e, pior ainda, do seu autor, tão depreciativamente que este, sangrando já dos lábios mordidos por raiva e frustração, soergue-se num ímpeto descarregando murros e pontapés e bofetadas no apresentador. Banda sonora: a orquestra de Stan Kenton. A isto talvez pudéssemos chamar lançamento, teria algo de desportivo. E como é óbvio, o espectador solitário iria à vida sem sequer haver adquirido um exemplar do livro. Para quê? Para ornar estantes?
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