quarta-feira, 16 de abril de 2025

50 X 30

 


“Bitches Brew”: Miles Davis
 
Dizem ser o álbum mais marcante da fase eléctrica, mas com Miles Davis nunca se sabe. A trompete anda por ali a planar sobre a paisagem traçada pelo piano eléctrico de Joe Zawinul, aparecendo e sumindo-se como uma ave esquiva. Quando se mostra, exibe todas as suas tonalidades. Também o guitarrista John McLaughlin, que nesses idos de 69/70 se estreara em disco como líder de uma banda, vai dando conta da sua presença numa economia de improvisos que os críticos associam geralmente ao rock, mas a mim faz mais lembrar um certo minimalismo experimental e repetitivo com escola pelos anos de 1960. Enfim, não vou meter-me onde não sou chamado, até porque o que verdadeiramente me agarra neste disco é a sua resistência aos formatos convencionais e às normas na base de conceptualizações nada sedutoras. O tema que ofereceu título ao conjunto, por exemplo, até pelo desafio que nos coloca do ponto de vista do sentido — bitches são putas, brew pode ser uma poção feita por feiticeiros — remete para uma irónica imagem de feitiços associados à sedução erótica. Qualquer coisa como o feitiço das putas, algo que vai bem com a magia desta música num clima de degenerescência do jazz em que o sucesso comercial impunha os seus pré-fabricados pop. Eu senti-me amarrado à primeira audição, e de quando em vez lá regresso ao lupanar para voltar a provar a poção mágica destas meretrizes.

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